sexta-feira, 22 de julho de 2011

GAYS EM NOVELA: CENSURA OU PÚBLICO IMATURO PARA A DISCUSSÃO?

                                 
Dizem por aí que teledramaturgia, em geral, tem como uma de suas missões abrir a discussão sobre questões polêmicas, quebrar preconceitos e falar sobre tabus. Beijo entre um homem e uma mulher aconteceu, fez sucesso e hoje é totalmente aceito. O nu também foi uma grande etapa a ser ultrapassada, e é colocado no ar atualmente como nunca e encarado de forma normal pelos telespectadores. Mas há uma coisa que ainda não é discutida nas telinhas. Sim, voltamos para o ponto do beijo gay.
Depois de um tempo sem tocar no assunto profundamente, e evitar imagens mais íntimas entre personagens do mesmo sexo, a TV brasileira resolveu abordar a temática homossexual com mais força este ano. Atualmente, o Brasil acompanha duas novelas que abordam – ou abordavam até esta semana – o mundo gay: “Insensato Coração”, da Globo, e “Amor & Revolução”, do SBT.
Desde seu início, a novela global contou a história de três personagens gays: Eduardo (Rodrigo Andrade), Roni (Leonardo Miggiorin) e, por último, Hugo (Marcos Damigo). Nas últimas semanas, o público pôde ver uma maior aproximação entre Edu e Hugo e cenas que induzem o telespectador a pensar que os namorados passaram a noite juntos e se beijaram na boca. Mas o beijo, o abraço, o sexo não são mostrados em cena.
Em “Amor & Revolução”, a história chega a ser parecida, mas há um diferença que vale registrar. O romance de duas mulheres, Marcela (Luciana Vendramini) e Marina (Giselle Tigre), já foi bem exposto e até rolou beijo na boca em horário nobre da TV brasileira (foto). A sequência, no dia que foi exibida, ficou entre os assuntos mais falados nas redes sociais.
Porém, no início desta semana, a Rede Globo determinou que a história dos homossexuais Eduardo e Hugo “fosse completamente esfriada no folhetim”. Além disso, segundo o jornal "Folha de S.Paulo", a emissora pediu silêncio aos autores e atores, para que não levantassem nenhuma bandeira relacionada ao assunto  homossexualidade.
O mesmo jornal publicou uma matéria em que contava que o SBT também pediu para os atores “baixarem a bola” quando o assunto for o relacionamento entre as gays Marcela e Marina. Além disso, a novela “Amor & Revolução” já teve algumas cenas de uma aproximação maior entre as personagens vetadas pela emissora.
Há quem diga que a televisão é um meio de comunicação que atinge todos os públicos, independente de sua cor, sexo, classe social ou orientação sexual. Porém, vale destacar que o relacionamento homoafetivo não é necessariamente mostrado como realmente é.
Em tempos de lei de reconhecimento legal da união homoafetiva sendo aprovada no país, será que o público está preparado para encarar cenas de beijo, nudez e até sexo entre pessoas do mesmo sexo? Ou, na verdade, são as emissoras de TV que não querem arriscar seus valiosos números de audiência colocando no ar o que pode não agradar muita gente? Será uma auto-censura?
O Famosidades, portal de jornalismo, misturado á entretenimento, que hospeda os serviços da Microsoft, como o Hotmail e o Live Mensseger, conversou com Rodrigo Andrade, ator que dá vida a Eduardo na novela “Insensato Coração”. Além de ter um namorado (Hugo, vivido por Marcos Damigo), o personagem estava em intenso conflito com sua mãe, Sueli (Louise Cardoso), que sofreu assim que soube da orientação sexual do filho.
Questionado se essa não seria a hora de arriscar e colocar no ar cenas mais quentes de Eduardo e Hugo, como nudez, o ator se mostrou esperançoso. “A Globo tem um grande padrão de qualidade. Ela tenta fazer uma imagem que não vai agredir. Cena de homens nus vai chocar. A gente já está no crescente. Uma hora isso vai rolar, sim, do mesmo jeito que rola cenas de sexo entre homem e mulher... Mas vai levar um tempo para ser uma coisa natural”, disse.
Rodrigo também comentou que é favor do beijo gay na novela, mas ponderou: “Eu faria, mas não acho necessário. Porque a história entre Eduardo e Hugo já está muito bem contada. É uma história de amor. Não são dois adolescentes. Eles se amam, se apaixonaram. Igual um homem se apaixona por uma mulher. Quando a gente se apaixona por homem e mulher, a gente vai atrás, chora, briga. Acho que o beijo é um símbolo importante de carinho, atenção. Um beijo fala mais do que mil palavras. Se rolasse beijo seria legal. A sociedade precisa parar de ver isso como uma coisa absurda. Acho uma bobagem essa polêmica [de beijos gays em novela]. Se rolasse, acho que conseguiria mostrar para a sociedade que é normal e que não vai machucar ninguém. Acho um pouco difícil. Mas se não rolar, não vou me sentir frustrado”.
Mas parece que a homofobia e a homossexualidade não são causas a serem criticadas, apoiadas ou, simplesmente, discutidas nas novelas brasileiras. Pelo menos não ainda. Na tarde da última terça-feira (19), a Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT) enviou um comunicado à Rede Globo criticando a posição da emissora de censurar a novela:
“Entendemos que, longe de estar fazendo uma apologia, a novela está cumprindo um papel importantíssimo como veículo informativo, servindo para desmistificar a homossexualidade perante a sociedade em geral, contribuindo para modificar as atitudes que fazem prevalecer a homofobia. Censurar neste momento parte do teor que já vinha sendo anunciado pela própria emissora mesmo antes da novela ir ao ar, nos parece um recuo que apenas serve para referendar a mensagem que a própria novela estava passando: a homofobia ainda está predominante em nossa sociedade”.
Procurada pelo mesmo site, a assessoria da novela global respondeu às críticas sobre censura de sua trama:
“Em primeiro lugar, a obra não é de terceiros. É da TV Globo que contrata autores para escrever as suas histórias que leva ao ar a todos os brasileiros. Logo, não se pode falar em censura porque a obra é nossa. No nosso entendimento, a causa é a diversidade e o respeito às diferenças, e não propriamente a homossexualidade ou a heterossexualidade, ou quaisquer outras formas de orientação individual. A ciência - incluindo Freud - reconhece que a sexualidade, com suas variantes éticas e morais - é baseada na singularidade. Nossas tramas registram a afetividade e o preconceito, mas não cabe exaltação. Cabe, sim, combater a intolerância, o preconceito e a discriminação contra elas, o que temos estimulado cotidianamente inclusive por meio de campanhas. Porém, a livre sensibilidade artística é a única medida possível para delinear a ousadia criativa, o que vale para toda e qualquer situação ou tema. Esse desafio torna-se ainda mais difícil quando se trata de respeitar uma audiência não-segmentada, múltipla em suas expectativas e preferências”.
Na real, Gilberto Braga e Ricardo Linhares avisaram, antes mesmo da novela se iniciar, que iam narrar histórias homoafetivas ao longo do folhetim, e parece que receberam mesmo um "pedido" para dar um breque na história romântica de duas pessoas do mesmo sexo.
Perguntado como era o assédio do público na rua, Rodrigo Andrade disse que a reação das pessoas é “bem bacana”. “A repercussão ficou muito grande na rua. Sempre uma resposta muito positiva. Até hoje ninguém veio com o preconceito, com piadinhas de mau gosto. Já está ficando comum. Já vieram até homossexuais conversar comigo, dizendo que se identifica com Eduardo. Teve até um homem que me disse que até parecia que Gilberto Braga sabia as palavras que a mãe dele usou quando mostrou a cena da conversa entre Eduardo e sua mãe, Sueli”, contou ele ao Famosidades.
“Insensato Coração” não começou a abordar um assunto apenas com a mídia e os telespectadores, não. Até os personagens tiveram uma mudança de visão sobre homossexualidade com a trama, como Rodrigo. “Mudei muito, muito, muito. Cresci como ser humano. Antes da novela, nunca tive preconceito, mas era um mundo desconhecido pra mim. Se eu visse um link sobre um assunto em um site, por exemplo, não parava para ler. Não me chamava atenção”, admitiu.
Porém, o ator mudou quando começou a estudar para o personagem e percebeu o quanto ruim para a sociedade é o preconceito sexual. “Me sinto agredido também quando vejo notícias de pessoas que batem em homossexuais. Sou totalmente contra a homofobia. Levanto a bandeira e não vejo problema nisso”, disparou ele, que ressaltou que está “representando um ser humano de bem, de caráter”.
Na novela global, a censura vale somente para os personagens Hugo e Eduardo. Espevitado, cheio de humor e com cenas um tanto caricaturadas do cotidiano de um gay, Roni (vivido por Leonardo Miggiorin) terá suas cenas sem nada de censura.
Vale destacar que, nessa semana, o Ministério da Justiça decidiu manter a classificação indicativa de “Insensato Coração”, não recomendada para menores de 12 anos. O órgão público avalia que a novela tem exibido conteúdo de relevância social, principalmente para valorização e respeito aos direitos homossexuais.
Mas parece que não é isso o que está acontecendo, não é?! Em 2011, temos a impressão de que estamos vivendo sob censura, sob medo constante de "ferir" o outro com algo "fora do comum". Resta-nos saber se as emissoras brasileiras que resolveram tocar na ferida, e mostrar quem machuca e quem é machucado, estão com medo de se aprofundar ainda mais nessa experiência, ou se é o público que ainda não está preparado para aceitar o assunto.

(Texto: Tayanara Magarroto)

quinta-feira, 7 de julho de 2011

HUMOR LIMITADO, AINDA É ENGRAÇADO?

Talvez a pergunta mais coesa para esta questão seria: humor com limites, ainda continua sendo humor? Explica-se: a edição de maio da revista Rolling Stone traz na capa o jornalista e comediante Rafinha Bastos (do programa CQC, da Rede Bandeirantes, a BAND), vestido de Jesus Cristo e um texto que tenta explicar por que o humorista acha engraçado fazer insultos. Ele faz parte da geração de artistas brasileiros que aderiram ao stand-up comedy, show de humor, muito popular nos Estados Unidos, em que o comediante se apresenta sozinho, sem figurino nem personagens. A ideia é transformar situações cotidianas em piadas.

Os artistas norte-americanos costumam usar suas próprias características para ilustrar o show, como o fato de serem negros, baixinhos, gordos ou falar de suas profissões, por exemplo. Essa característica do stand-up nem sempre é respeitada em terras brasileiras. O artista faz piada sobre negros, sendo branco, por exemplo, e isso pode soar ofensivo. Como no caso em que Rafinha Bastos, que é gaúcho, disse que em Rondônia só há gente feia. O governador do estado, Confúcio Moura, está processando o artista.

Uma das piadas que também não emplacou no show de Rafinha, mas da qual ele não desistiu, diz que todas as mulheres estupradas são feias e os homens que as violentam, em vez de cadeia, merecem abraços. A polêmica não está em torno do tema violência sexual, usado por inúmeros artistas, mas a maneira como ele é tratado por Bastos, que afirma: ”no meu show eu falo o que penso”.

A postura do comediante diante da piada que não deu certo abre o debate sobre os limites do humor. Muitos humoristas já entenderam que há limites que devem ser respeitados. Jorge Louredo, ator famoso por interpretar o personagem Zé Bonitinho, em debate realizado no Centro Cultural Banco do Brasil no último dia 3, disse que humor deve ser tratado como coisa séria e que a experiência ensina que existem coisas que funcionam para alguns e para outros não. “Não existe humor universal. O que é engraçado aqui não é em outro lugar. Humor é coisa séria. Humor deve ser usado para resgatar uma pessoa da dor ou da repressão. Nunca para ofender. O humor é livre, mas o humorista tem que ter bom senso”, argumenta.

Rafael Cortez,  jornalista e comediante, que também esteve presente no debate, concorda com Louredo. Ele é repórter do programa CQC, em que Bastos é um dos âncoras, mas pensa diferente do colega. “Na teoria não deveria haver limite para o humor, mas na prática não é assim. Tem limite sim. Você não quer ser mal visto. Você fica chateado se uma piada sua não emplaca e você amadurece com isso e começa a se policiar mais”.

Já Rafael Bastos disse em entrevista ao portal CQC que tenta não limitar seus temas. “Eu me direciono somente pela graça. Se acho engraçado, eu falo. E acho que tem que ser assim, o alvo do humor não deve ter limite. Para mim, humor controlado não é humor”. Além disso, o comediante diz que o seu público alvo são pessoas que pensam como ele. “É isso que eu exploro: fazer humor para pessoas parecidas comigo. Deu certo. Tudo o que faço sou eu, não interpreto nada. Todas as minhas criações têm como inspiração minha própria vida”.

O assunto divide opiniões na internet. Há aqueles que concordam com os comediantes que defendem o humor sem limites e criticam àqueles que se sentem ofendidos e recorrem ao judiciário para resolver a questão. Muitos acham que existe uma corrente politicamente correta que se esquece do direito à liberdade de expressão. Mas o escritor Alex Castro, dono do blog Liberal, Libertário, Libertino, um dos mais lidos da internet brasileira, diz em sua página que estes que reclamam da “patrulha politicamente correta” esquecem, — ou não sabem — o que significa liberdade de expressão. “Liberdade de expressão é o cara poder fazer piada sobre mulher estuprada e nós podermos criticá-lo por isso. A liberdade que eles querem é a liberdade de falar os maiores absurdos e não serem criticados por isso. Falar besteira, qualquer criança fala. Adulto é quem sabe que falar significa se abrir para a possibilidade de ouvir a resposta”.

Castro ressalta que é contra qualquer lei que regule o discurso e o pensamento. Para ele leis deveriam regular ações. Além disso, ele relembra que liberdade de expressão dá a cada cidadão o direito de falar o que quiser, mas também o dever de responder por suas palavras. “Não podemos esquecer nunca a função social mais importante da liberdade de expressão: sem ela, como saberíamos quem são os idiotas?”, finaliza.

Caro leitor, Em sua opinião o humorista deve se pautar pelo que ele considera engraçado, ou ele deve pensar em primeiro lugar no público? Você acha que deve haver limites para o humor?
E você, já se sentiu particularmente ofendido com alguma piada que ouviu? 

Fonte e Texto: opinião e notícia, com adaptações.

quinta-feira, 16 de junho de 2011

UM PAÍS NA CONTRAMÃO.

A presidente Dilma Rousseff inaugura com toda a pompa e circunstância mais um grandiloquente programa social, meio que nos pretensiosos termos do fracassado Fome Zero, do início do primeiro governo de seu mentor (quiçá condutor) político. Quatro bilhões de reais – e não vinte – serão empregados na “erradicação da pobreza” (16 bi já integram o bolsa-família). Dilma faz seu discurso ao lado do terceiro suspeito de irregularidades a ocupar a mesma Casa Civil que ela chefiou no governo Lula.

Enquanto isso se discute o trem-bala de 30 ou 50 bilhões de reais, uma diferença irrisória, com a menor das duas cifras suficiente para construir trezentos quilômetros de metrô. Mas um reluzente trem ligando o Rio a São Paulo é a prioridade na sábia visão de nossos governantes.

Nosso Brasil bêbado se equilibra nas mentiras da politicalha que rasura a história da nação pelas mãos do pseudo-democrata José Ribamar Sarney, nos anais do Senado; a pátria mãe gentil troca saneamento básico pela impunidade de seus filhos prediletos, a mãe desnaturada que distingue os seus.

Somos, definitivamente, um país na contramão, uma democracia em marcha à ré, com jornais censurados, à moda argentina, venezuelana, equatoriana.

Nunca vimos o Brasil tão próspero e, contraditoriamente, tão jogado às traças. As traças da corrupção, do mandonismo, do Estado empresário-sindicalista.

Deve-se rir ou chorar quando se lê que a abominável usina hidrelétrica de Belo Monte poderá custar 7, 19 ou 35 bilhões de reais? Este orçamento, ou melhor, chute, mero palpite, nos causa calafrios, porque sabemos que a conta do escárnio será fatalmente espetada em nossas costas, enquanto empreiteiros e políticos festejam os lucros gerados pela Hidra de Lerna que se construirá no Norte.

O incansável jornalista Washington Novaes prega no deserto verdades insofismáveis, que não interessam aos condutores de nossa tresloucada locomotiva. Sempre embasado em dados facilmente verificáveis, ele diz que o Brasil poderia, com certeza, reduzir a cerca da metade os altíssimos custos da energia que consome, apenas com a repotenciação das turbinas já existentes, com a redução das perdas na transmissão e com a conservação e eficiência.

Quem de nós não morre de vergonha ou de raiva quando se revela uma incúria atrás da outra perpetrada pelo Ministério da Educação e Cultura (MEC)? A desmoralização do Enem é eclipsada pela barbárie da escolha de livros de português que ensinam a norma inculta, literalmente! Mas nossa indignação com o episódio mal teve tempo de ser digerida e outro escândalo rebenta no MEC, com livros de matemática “ensinando” que dez menos sete dá quatro!! Nós, contribuintes, pagamos 14 milhões para recebermos essa estarrecedora notícia!

Ora, que diferença haveria em ter à frente do MEC o ex-palhaço, deputado federal Tiririca – cujo mote de campanha era “pior do que tá não fica” – ou o acadêmico Fernando Haddad?

Fica apenas a dúvida se Tiririca tem razão ao asseverar que “pior não fica”.

Fonte: "opinião e notícia" - título original: Brasil, um país na contramão. (veja aqui) 

quinta-feira, 9 de junho de 2011

PRESSIONAR O LEGISLATÍVO LEGÍTIMO. O QUE NÃO PODE ACONTECER É O USO DE FORÇA.

Fortaleza assistiu, na última terça-feira, a um espetáculo condenável de bloqueio da Câmara Municipal por manifestantes grevistas do movimento reivindicativo de professores municipais que tentavam impedir a votação da revisão salarial da categoria. Protestar é um direito acolhido pela democracia, mas não a investida contra o funcionamento de um dos poderes municipais.

A indignação dos professores municipais por considerarem irrisórios os índices salariais oferecidos pela Prefeitura é perfeitamente compreensível e até respaldada por segmentos da população (independentemente da constatação sobre as possibilidades orçamentárias reais do Município). Não entraremos no mérito dessa questão, embora o elemento orçamentário disponível não possa ser ignorado na equação.

Pressionar o Legislativo é legítimo, o que não pode ser aceita é a utilização da força para impedir o funcionamento da Câmara Municipal. Ao fazerem isso os grevistas cederam à irracionalidade e investiram contra a ordem jurídica. Não é possível contemporizar com esse tipo de equívoco, pois ele mina a questão básica da legitimidade das instituições e do próprio regime democrático representativo. Se este é relativizado – mesmo no estrito círculo municipal – seus efeitos não deixam de ser repassados para todo o organismo institucional, ficando a espreita de novas oportunidades para se manifestar.

Por terem agido certo na defesa do Poder Legislativo municipal, não deve levar as autoridades a dispensarem um exercício autocrítico na forma como conduzem sua relação com a categoria dos professores. Esta é muito sacrificada. A solução satisfatória dessa questão ultrapassa o poder de decisão do Município, porém o desafio de uma administração comprometida com a transformação é de, ao menos, conseguir demonstrar que é possível construir uma parceria com a categoria, levando-a a participar da gestão do problema, vendo-o por dentro.

Claro, há segmentos (minoritários) do movimento reivindicatório que sempre são contrários a qualquer acordo, por estratégia política. Mas a grande maioria dos professores certamente não pensa dessa maneira e poderia - quem sabe? - ser sensível a isso se confiasse nas intenções dos gestores.

Fonte: Editorial do jornal O Povo de quinta-feira.  - título original: "crise dos professores: racionalidade  segurança" (veja aqui)

domingo, 15 de maio de 2011

JORNALISMO ONLINE: QUEM É O LEITOR VIRTUAL?

Se depender dos resultados de uma pesquisa do Projeto pela Excelência do Jornalismo (PEJ), dos Estados Unidos, a produção de notícias tende a se tornar uma tarefa cada vez mais complexa, diversificada e imprevisível. É que os dados apontaram a existência múltiplos tipos de leitores, cada um com suas características e necessidades informativas.
Depois de pesquisar o comportamento dos leitores de 25 sites noticiosos na internet norte-americana durante nove meses, o trabalho patrocinado pelo Centro de Pesquisas Pew chegou a constatação de que existem vários tipos de leitores, o que leva à conclusão de que é inviável criar um padrão único de produção noticiosa.
Na teoria, isso não chega a causar espanto porque todo o profissional que tem um mínimo de faro noticioso sabe que a diversidade social é um fato. O problema é que as conclusões da pesquisa nos levam a refletir sobre o modelo de produção de notícias adotado pelos jornais e pela indústria jornalística.
Até agora era muito difícil pensar na diversificação da produção informativa porque havia a necessidade de um forte investimento para comprar rotativas ou equipamentos eletrônicos para rádio ou TV. Para que o investimento valesse a pena, era imprescindível a produção em massa de conteúdos com características unificadas para atingir o maior número possível de consumidores, com preços acessíveis.
Mas quando surgiram a computação digital e a internet, a situação mudou. A necessidade de capital para publicar notícias ficou reduzida ao preço de um computador e do acesso à web. Com isso a queda no custo de produção de informações caiu brutalmente, gerando um crescimento vertiginoso no número de usuários e com ele uma enorme demanda por diversificação noticiosa.
Este processo explica os resultados da pesquisa feita pelo PEJ e mostra qual a natureza do dilema enfrentado pelos jornais e emissoras de rádio e TV. Só entendendo como e por que surgiu a chamada Economia da Informação em Rede (Networked Information Economy) é que será possível superar os impasses criados pela Economia da Informação Industrial (Industrial Information Economy) [definições de modelos econômicos de produção inspiradas no trabalho de Yochai Benkler, autor de The Wealth of Networks, Yale University, 2006].
A notícia não pode mais ser produzida de forma industrial conforme o modelo convencional de negócios dos grandes grupos contemporâneos da mídia. E é isso que dificulta a solução do problema da queda de receita dos jornais porque o produto que eles oferecem — além de ser caro, pela necessidade de gerar retorno do capital investido — não consegue atender à diversificação de interesses dos usuários.
O que os donos de jornais estão tendo dificuldade de entender é que a economia da informação mudou e que isto implica novos processos de produção e de faturamento. O modelo convencional não oferece mais o mesmo retorno financeiro. É possível que algumas empresas consigam descobrir alternativas, mas a grande maioria está fadada a desaparecer, da mesma forma que as máquinas de escrever e calculadoras mecânicas saíram do mercado.
A pesquisa mostrou que o site Yahoo! News tem quase três vezes mais visitantes que a versão online do The New York Times, o jornal tradicional mais procurado e mais confiável entre todos os incluídos na investigação. Isso comprova o prestigio do Times mas mostra que os leitores preferem informação diversificada, já que o Yahoo! poderia ser comparado a uma revista de variedades.
O usuário de informações online é inconstante e prefere visitar várias fontes ao contrário do leitor convencional, cujo cardápio informativo é reduzido a duas ou três fontes. Nada menos que 70% dos usuários visitam o mesmo site de notícias no máximo duas vezes por mês, e não ficam mais de cinco minutos em cada um deles.
Muitos consideram isso um sintoma de superficialidade cognitiva, sem levar em conta as mudanças ocorridas na ecologia informativa do mundo digital.

Fonte: Observatório da imprensa - Autor: Carlos Castilho (Título original: "pesquisa tenta desvendar os mistérios do leitor virtual")

segunda-feira, 2 de maio de 2011

O QUE REALMENTE MUDA COM A MORTE DE OSAMA BIN LADEM?

Os norte-americanos finalmente mataram Osama Bin Laden, nove anos e sete meses depois dos ataques de 11 de setembro causarem a morte de aproximadamente 3 mil pessoas nos EUA. Os norte-americanos mataram e depois levaram o corpo de Bin Laden. Isso é vingança, mas também serve para dissuadir futuros atos terroristas. Essa foi a conquista mais importante para os EUA desde que iniciou sua guerra contra a Al Qaeda. Mas o que a morte do terrorista realmente significa?

Primeiro, é bom para a reputação, o poder e a influência dos EUA, que finalmente pegaram seu principal inimigo. A capacidade de Bin Laden de eludir os norte-americanos e a sua aparente impunidade alimentavam, em algumas regiões islâmicas, a imagem dos EUA como um tigre de papel, encorajando extremistas. O próprio Bin Laden disse uma vez que as pessoas apostam no cavalo forte, o cavalo que vai ganhar. Sua morte destaca que os Estados Unidos são o cavalo em que se deve apostar.

Dito isso, matar Bin Laden não aniquila a Al Qaeda. O egípcio Ayman al-Zawahri, o número 2 da organização terrorista, há muito tem desempenhado um papel crucial como chefe de operações da Al Qaeda. E a Al Qaeda é mais uma rede de células frouxas e espalhadas do que uma organização bem estruturada. A AQIM, a versão da Al Qaeda no Norte da África, é uma ameaça real em países como Mali e Mauritânia, mas matar bin Laden provavelmente terá consequências negligenciáveis por lá. Os terroristas da AQIM podem admirar Osama e se inspirar nele, mas eles também tem autonomia. Anwar al-Awlaki, o terrorista ligado à Al Qaeda no Iêmen, também não se sentirá intimidado pela morte de Bin Laden. A capacidade de Awlaki de orquestrar atos terroristas será muito mais afetada pelas convulsões políticas que ocorrem agora no Iêmen.

Também é verdade que a morte de Bin Laden teria importado mais em 2002 ou 2003. Naquele tempo, em países como o Paquistão, muitas pessoas tinham grande apreço por Bin Laden e até duvidavam do seu envolvimento nos ataques do 11 de setembro. Com o tempo, essa visão mudou: a opinião popular virou contra Osama, e já não vemos camisetas estampadas com seu rosto à venda nas lojas. Algumas pessoas ainda sentem admiração por sua capacidade de fugir dos Estados Unidos por tanto tempo, outros são tão antiamericanos que abraçam qualquer um que não goste dos EUA, mas é inegável que Bin Laden foi marginalizado ao longo do tempo.

O declínio da imagem de Osama também significa que ele não será visto como mártir em muitos círculos (por outro lado, se os norte-americanos parecerem muito festivos e triunfantes, podem gerar simpatia para Osama). Muitos paquistaneses, iemenitas e afegãos irão simplesmente dar de ombros e seguir em frente. Sua morte não vai inspirar as pessoas, da maneira que poderia ter inspirado em 2002. E a Al Qaeda já está passando por um momento difícil, porque tem sido ofuscada pelos protestos da primavera árabe. A morte do líder é apenas mais um golpe.

Será fascinante observar a reação do Paquistão à operação militar dos EUA em seu território. Em seu discurso, o presidente Obama esforçou-se para mostrar deferência ao Paquistão e ressaltar que Osama era um inimigo do Paquistão também exatamente porque ele está preocupado com a reação dos paquistaneses.

As autoridades paquistanesas, que sempre negaram a presença de Osama em seu território, não foram informadas da missão com antecedência, um detalhe que pode agravar as tensões com o país. Enquanto não é surpreendente que Osama foi encontrado no Paquistão, a maioria acreditava que ele estava escondido nas remotas regiões tribais. O fato de ter sido encontrado em uma cidade relativamente grande que abriga uma base militar paquistanesa levanta questões perturbadoras sobre o que os soldados do país realmente sabiam sobre sua localização.

Uma questão agora é saber se a morte de Osama vai ajudar a rastrear Zawahri e outros líderes da Al Qaeda, seja no Paquistão ou em outros lugares remotos do planeta. O assassinato também pode ajudar na busca por redes de financiamento do terrorismo.

Haverá um ataque em represália pela Al Qaeda? Talvez. Mas a Al-Qaeda já estava tentando atingir os EUA, e não é como se demonstrasse qualquer resguardo nesse sentido.

O maior desafio agora é usar a morte de Osama para desmantelar a Al Qaeda na região do Afeganistão e Paquistão. Pode ser mais fácil terminar a guerra no Afeganistão agora, facilitando um acordo entre o governo de Karzai e o Talibã. Os talibãs não estão envolvidos em atos terroristas exceto ao conceder abrigo para a Al Qaeda. Mas se combatentes importantes como Osama bin Laden estiverem fora do caminho, um acordo se torna mais viável.

Finalmente, o que a morte de Osama significa para as perspectivas políticas do presidente Obama? Não muito. As eleições de novembro de 2012 ainda estão muito longes e a principal questão política ainda é a economia. Afinal, George H.W. Bush era considerado um herói depois da vitória na Guerra do Golfo, no início de 1991, e em novembro de 1992 foi derrotado por Bill Clinton por causa da desaceleração econômica.

Fonte: Opinião e notícia/ The New York Times (After Osama bin Laden)

terça-feira, 26 de abril de 2011

A INFORMAÇÃO VISTA "DO OUTRO LADO DO BALCÃO"

Um dos melhores pontos de observação da imprensa é o que poderíamos chamar de “o outro lado do balcão”, ou seja, como fornecedor de informações. Por conta da consultoria que dou à recém-criada Universidade Federal da Integração Latino-Americana (UNILA) acabei levado para o lado de quem dá notícias para a imprensa e aí é possível observar alguns desvios de conduta no comportamento dos repórteres em geral.

Há dois problemas predominantes: a subserviência e a arrogância. No primeiro caso, o repórter se comporta como se fosse um escriba, datilógrafo ou digitador: simplesmente reproduz o que é dito pelo entrevistado, sem questionar ou contextualizar. Este tipo de repórter, em geral, é bem visto pelos políticos e empresários porque não incomoda, mas é o que mais erros comete porque lhe falta visão de conjunto. Mas como o erro é “a favor” , poucos se queixam.

Já o outro tipo de repórter chega para uma entrevista ou matéria com uma pauta prévia e geralmente está apenas a procura de fatos, histórias e citações que justifiquem ou reforcem uma ideia já estabelecida. É o repórter que passa o tempo todo jogando “cascas de banana” para o entrevistado esperando que ele escorregue numa delas.  Isto faz parte de uma estratégia que transforma a entrevista num interrogatório. Este tipo de repórter também comete muitos erros, mas eles são em geral gerados pelo fato de o profissional tentar acomodar os fatos encontrados à agenda que trouxe da redação.

Os dois comportamentos são igualmente equivocados do ponto de vista da informação transmitida ao público, embora nas redações o primeiro seja criticado e o segundo, elogiado.  A dinâmica industrial predominante na maioria das redações é a principal responsável por esses dois tipos de distorção que acabaram se tornando tão comuns que já foram incorporados à rotina.

O desenvolvimento das técnicas de media trainning levou os entrevistados, especialmente os situados em cargos importantes ou as personalidades públicas, a usarem o contato com a imprensa como espaço para promoção pessoal ou institucional. Os inúmeros artifícios e recursos desenvolvidos por especialistas contribuíram para distorcer ainda mais o resultado de uma entrevista, pois o público acaba tendo que se esforçar para saber até onde vai a notícia desinteressada e onde começa o marketing disfarçado de informação.

Essa dúvida leva muitos entrevistados a achar que os repórteres têm sempre uma agenda oculta quando fazem uma pergunta. Com isso, tanto o entrevistador como o entrevistado se comportam como se  estivessem num jogo, mais preocupados com a performance do que com a informação. Quem acaba perdendo é o leitor, que não participa do jogo e tem dificuldade para “ler nas entrelinhas” — ou seja, o que não é dito formalmente  pelo repórter e pela fonte.

A relação entre repórter e fonte passa cada vez mais pela desconfiança, o que provoca situações paradoxais. Os entrevistados aguardam a publicação da reportagem como se ela fosse uma espécie de veredicto. Isso faz com que o temor de ver declarações publicadas fora de contexto acaba levando muita gente e evitar o contato com a imprensa.

O jornalista, por seu lado, enfrenta um número crescente de condicionamentos ao seu trabalho por pessoas e instituições interessadas em se proteger contra o que muitos já chamam de síndrome das meias verdades. É difícil a imprensa publicar hoje uma mentira completa  por temor de represálias legais. Mas são cada vez mais frequentes as meias verdades, isto é, fatos e dados sem uma contextualização adequada. É o famoso caso do copo meio cheio ou meio vazio, tudo depende do contexto em que o fato foi situado.
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O fato concreto é que as entrevistas jornalísticas perderam o seu significado como ferramentas de comunicação para se tornarem exercícios de marketing institucional e pessoal. A maior preocupação, tanto de entrevistador como do entrevistado, é tentar descobrir o que o outro está tentando ocultar ou qual recado que está procurando passar de forma velada.

O resultado é que raramente ambas as partes saem satisfeitas de uma entrevista. O entrevistador porque dificilmente conseguirá tirar tudo o que desejava da fonte e esta porque normalmente critica o enfoque dado ao texto, a seleção de informações, o estilo narrativo usado e as fotografias escolhidas. Nenhuma das partes se dá conta de que uma entrevista é também um momento de diálogo entre um repórter e uma fonte informativa, no qual o primeiro tenta captar o conhecimento do interlocutor para transmiti-lo ao público.

E o segundo tem uma oportunidade rara de entender como uma informação pode ser melhor compreendida pelo leitor, em vez de se preocupar apenas com sua imagem pessoal e encarar o jornalista como um mero transmissor de recados, ou ainda como alguém especializado no escambo informativo.   

A  solução para esses problemas é elementar e óbvia, mas apesar disto dificilmente levada em conta pelos dois ‘lados do balcão’: ouvir o que o outro tem a dizer.

Autor: Carlos Castilho